segunda-feira, 19 de junho de 2006

Na trave!

Brasil 2 x 0 Austrália foi uma vitória de sufoco, mas o que eu queria comentar mesmo é bola na trave. O jogo teve duas: uma de Kaká, não convertida, outra de Robinho, que retornou aos pés de Fred e resultou no segundo gol (isso é só pra informar quem tava em outro planeta na tarde de domingo, e pra situar o leitor daqui a dez anos). Meter uma bola no travessão talvez seja mais difícil que colocá-la pra dentro da rede. Se as regras do futebol mudassem tanto quanto as do vôlei, talvez a jogada já estivesse valendo por meio gol ou contando como critério de desempate. Mas acontecimentos raros são muitas vezes apenas isso: pretexto pra pensatas sobre acaso versus destino e pra inevitáveis metáforas.

Há bolas na trave que prenunciam insossos zero a zero ou derrocadas que nem viagra resolve. Outras, como a que espirrou pros pés de Fred e mudou a vida dele, são como dádivas de amor platônico. Improbabilíssimas até acontecerem. Qualquer que seja a categoria da bolada no travessão, ela provoca admiração pela beleza plástica, pelo impacto que tonteia. Mas, ao contrário do gol, que depois do clímax costuma conduzir a um relaxamento satisfeito, esta jogada não leva necessariamente ao gozo. É uma guinada do imponderável, cheia de reticências, pensamentos sobre realidades paralelas ("e se...?"), promessa de agruras ou delícias... Pensando bem, não dá pra existir meio gol. Ou é ou não é.