quinta-feira, 15 de fevereiro de 2007

Segurança pública em debate



Recomendo a leitura da entrevista de Luiz Eduardo Soares, um dos maiores especialistas em segurança pública do país, no portal do PPS. Ele desqualifica o comportamento"demagógico e populista” do Congresso Nacional diante de tragédias como a morte bárbara do menino João Hélio, de seis anos. Defende uma reforma profunda na instituições para que as leis já existentes possam ser cumpridas, explica por que é contra a redução da maioridade penal e denuncia o genocídio de jovens brasileiros negros do sexo masculino. Abaixo, um trecho:



(...)
O problema da segurança pública é muito mais grave. Não pode ser tratado com enrijecimento de penas e outras medidas desse tipo, que já se comprovaram ineficazes, inteiramente distantes das reais necessidade. Nós precisamos de uma reforma profunda nas instituições da segurança pública, de mudanças constitucionais, de políticas preventivas articuladas num sistema único de segurança pública, que envolva compromissos de investimentos reais por parte do Estado em todas as esferas, desde o município até a União. Conceber um plano amplo e sistêmico exige um outro tipo de postura, muito diferente dessa que tem caracterizado a reatividade do Congresso Nacional. (...)


No Brasil, há cerca de 45 mil crimes letais por ano e aproximadamente 40 mil homicídios dolosos anualmente. São números extraordinariamente elevados, que correspondem a 27 vítimas por 100 mil habitantes. Nos Estados Unidos são oito; na Europa, menos de três; no Japão menos de um. Quando observamos os dados desses crimes mais de perto, compreendemos que há uma forte concentração nesse processo de vitimização. Apesar de os problemas dizerem respeito à sociedade brasileira em seu conjunto, há uma concentração numa determinada faixa social quando se trata do processo de vitimização letal. Quem está morrendo são sobretudo jovens entre 15 e 24 anos, pobres, moradores das periferias, das favelas, das comunidades e, em geral, negros e do sexo masculino. Isso é tão grave e tem atingido patamares tão elevados que já há um reflexo desse processo na estrutura demográfica brasileira. Há um déficit de jovens do sexo masculino nessa faixa etária, de 15 a 24 anos, que já caracteriza esse processo como genocídio. Quando um demógrafo observa essa configuração populacional sem saber a que sociedade se reportam esses dados, tende a deduzir que se trata de guerra porque só uma sociedade em guerra tende a produz esse tipo de conseqüência no perfil demográfico. Estamos diante de um quadro muito peculiar, extremamente grave; de um processo de genocídio dos nossos jovens; num processo autofágico, fratricida, do qual tem sido co-responsável, cúmplice, o próprio Estado, na medida em que, por omissão ou por ações ilegais, tem contribuído para esses resultados. (...)